
COMO DESTRUIR UMA CIDADE – DO PRESENTE AO PASSADO - Utopia ou distopia
II – Pode-se falar em utopia ou em distopia?
A utilização aqui do termo utopia não será aquele de Thomas More no livro do mesmo nome, nem daquela discussão no seio do marxismo sobre o surgimento de uma nova sociedade que substituiria a sociedade capitalista. Estas são discussões que deverão ficar para outro momento, pois inserem-se num outro contexto político, muito mais complexo do que será tratado aqui por agora.
O conceito de utopia será utilizado de maneira mais simples, ou seja, como aquele que classifica o futuro como uma espécie de sonho a ser realizado, a ser conquistado do ponto de vista do desenvolvimento de uma cidade. Um sonho mais imediato. Como se diz no popular: isso é utópico, você está sonhando. Não seria um sonho se algumas regras fossem respeitadas. Contudo, esse desenvolvimento que deveria ser assimilado pelos Governos (legislativo e executivo) municipais, estaduais e federal, ou seja, por todo o conjunto de forças destinadas à administração de um determinado local, fossem respeitadas e democráticas. Ocorre que não é assim.
No Brasil, a administração das cidades sofre pela falta das “soluções de continuidade” causando graves danos à população. Ao mesmo tempo, não se vê nas legislações municipais, estaduais ou nacionais vontade de estabelecer sistematização concreta sobre o assunto. Há, portanto, enormes prejuízos para as localidades, uma vez que as disputas políticas acabam, na maioria das vezes, por destruir ações encaminhadas ou destruir obras a serem concluídas. Muitas ações são simplesmente abandonadas sem uma solução de continuidade. Sem decidir democraticamente se seriam boas ou não, se deveriam ser concluídas ou não. Assim, o personalismo de alguns governantes fazem da administração uma brincadeira, ou simplesmente, um caça níqueis. Haja visto os orçamentos secretos, os empréstimos fraudulentos, a ocupação de espaços sem nenhum controle da população.
Utopia, portanto, neste caso, seria o entendimento de que as administrações municipais respeitariam a vontade da maioria da população devidamente organizada. O país tem uma Constituição que todas as instâncias do poder deveriam respeitar. Na maioria das vezes essas portas são fechadas, pois as administrações que se elegem querem elas deixar suas marcas em detrimento do que muitas vezes foi bem feito anteriormente. Não se discute o melhor procedimento para o desenvolvimento da cidade e daquilo a que se deve dar continuidade, seja com relação às melhores obras nas áreas sociais seja nas áreas de desenvolvimento material urbana e rural. O que deveria ser mantido e desenvolvido, conforme as decisões da maioria e do quem vem dando certo. O Estatuto da Cidade, aprovado por lei federal em 2017, de certa forma propõe esse expediente. Por isso, instituiu consultas à população, estabeleceu o Plano Diretor como diretriz para controlar o desenvolvimento, propôs uma série de projetos de leis que deixavam claro como o desenvolvimento se daria, etc. Ocorre que 99% das cidades brasileiras não cumpriu e não cumpre essa lei como deveria, resultando que o próprio Estatuto da Cidade ficasse no campo da utopia.
Consequência: instala-se uma verdadeira distopia. O mundo de destruições irreversíveis, da violência, da depressão, das tristezas. É o mundo dos poderes políticos totalitários, da destruição das liberdades, da instalação da pobreza que é utilizada apenas para dar mais poder a um grupo privilegiado que usufrui das riquezas da sociedade. É o mundo de uma sociedade opressora e aterrorizante que disfarçadamente se impõe.
O site “Arte e Cultura” cita três exemplos que valem a pena conferir, pois são mais conhecidos. “Os romances 1984, do escritor George Orwell, e Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley”, clássicos de ficções distópicas. “A história em quadrinhos V de Vingança, que foi adaptada para o cinema, apresenta uma sociedade distópica brutalmente constrangida por um regime totalitarista”. “Outro exemplo de obra distópica na literatura e na televisão é O conto da Aia da autora Margaret Atwood. O livro foi adaptado para uma série e conta o futuro dos Estados Unidos. Nele, o país teria se transformado em uma sociedade altamente opressora, na qual as mulheres perderam todos os seus direitos.” Sugiro que a pesquisa sobre esses três exemplos seja muito útil para compreender a distopia.
Será que caminhamos para isso, ou secreta e disfarçadamente já vivemos aspectos dessa realidade? Será que o controle do legislativo, em muitos lugares, já não é um passo dentro desse contexto? Será que o caminho para se chegar à distopia é o dinheiro e a desonestidade? Será que as pessoas não percebem mesmo como se dá o processo capitalista de produção em que todos estão inseridos globalmente?
Em A Organização Interna das Cidades: A Cidade Caótica, em: “A Urbanização Brasileira”, como citado anteriormente, Milton Santos traz algumas pistas, cientificamente comprovadas de como se deram esses caminhos. É o que se começará a ver em seguida.
Seguimos para a inserção III
(sobre as fotos serão comentadas na categoria de Planejamento Urbano.
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